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Freakpolitics - o que diz o lado improvável dos políticos (12)

A política da felicidade e a sobremesa
O Governo deseja a nossa felicidade total enquanto a oposição quer ver-nos infelizes. Devemos incluir a felicidade no PIB?


O primeiro-ministro sobe ao palanque e diz: “As pessoas são muito mais felizes hoje do que antes do meu Governo...” As bancadas da oposição riem à gargalhada. O PM ironiza: “Como se vê pela reacção, até os senhores deputados estão contentes...”

Este discurso fictício não é uma brincadeira: em Setembro de 2009, o Presidente francês Nicolas Sarkozy pediu para o PIB também medir a felicidade das pessoas. O economista Bruno Frey, da Universidade de Zurique e autor do livro “Felicidade – uma Revolução na Economia”, disse esta semana ao Jornal de Negócios que se a felicidade “fosse um objecto político, as estatísticas seriam terrivelmente manipuladas”.

Mas já são. Os políticos passam o tempo a discutir a nossa felicidade por conveniência. Certa vez, António Guterres subiu ao palanque no Parlamento e debitou números sobre a quantidade de portugueses a comprar casa nova a crédito, a trocar de carro, a fazer férias no estrangeiro ou a encher os hotéis no Algarve. Em suma, os portugueses estavam muito felizes. Há umas semanas, no debate do Estado da Nação, a discussão entre José Sócrates e a oposição sobre a pobreza não foi mais do que um debate sobre a erradicação da infelicidade.

A felicidade é o seguro de vida de todo o governo, que procura demonstrar como as pessoas estão felizes, enquanto a oposição vampírica se alimenta da infelicidade alheia para o criticar. Quanto mais tristes e infelizes houver, mais hipóteses tem a oposição de ganhar as eleições. Quando a oposição ascende ao Governo, ela própria vai rapidamente inverter discurso para provar que toda a gente passou a viver mais satisfeita, justificando os sacrifícios pedidos ao País com as infelicidades do Governo anterior (exemplo: Durão Barroso e o discurso da “tanga”).

“A felicidade é um dos principais objectivos da vida – para muitos indivíduos é o objectivo fundamental”, escreve Bruno Frey em “Felicidade”. Mas o PIB não mede a satisfação com a vida. Vários estudos académicos verificaram que “nos EUA, Reino Unido, Bélgica e Japão, o rendimento per capita aumentou apreciavelmente em décadas recentes, enquanto a felicidade média permaneceu virtualmente constante ou mesmo desceu”, argumenta Frey. Facto: o crescimento da riqueza não produz um aumento proporcional de felicidade.

Mas todos os partidos desejam a nossa felicidade.

- O PS tem o rendimento mínimo, para atenuar a pobreza extrema; as scut, que nos permitem usar boas estradas sem pagar; o Magalhães, que faz as crianças felizes e dá aos pais uma ilusão de desenvolvimento.

- Para o PSD mais liberal de Passos Coelho, a liberdade de escolha induzirá mais felicidade. Os sacrifícios que ele quer pedir às pessoas servem para trazer mais felicidade no futuro.

- No caso do CDS, ser feliz é pagar menos impostos, dar melhores pensões aos velhos e punir o crime violento. Depois, como o ócio é das coisas mais contribui para a felicidade individual, Portas acha que o discurso contra os “subsídios à preguiça” fará felizes os que acham que os beneficiários do rendimento mínimo vivem alegres à custa dos contribuintes.

- Como há 100 anos, o PCP acha que o fim das desigualdades gera a felicidade universal com a abolição da propriedade dos meios de produção. Por um lado, os comunistas têm razão: segundo Frey, a percepção das desigualdades gera infelicidade. Por outro não: quem tem o seu negócio e possui os seus próprios meios de produção é mais feliz do que trabalhadores por contra de outrém.

- Já o Bloco de esquerda acha que o casamento dos homossexuais torna as pessoas mais felizes, e até pode ser verdade, porque de acordo com Frey, as pessoas casadas são mais felizes que as solteiras ou em união.

Infelizmente, Portugal está mais infeliz porque o desemprego tem um efeito devastador sobre a felicidade. Segundo Frey, o desemprego gera tristeza nas pessoas “mesmo sem estarem elas próprias desempregadas”. Quando o desemprego ultrapassa 10%, “reduz-se a satisfação com a vida”, escreve o economista.

David Landes, outro economista famoso, aponta a sobremesa como o problema de toda esta teoria. Landes, diz que vivemos para ser felizes mas isso não produz riqueza. A felicidade é um luxo recente, escreveu em 1998 no livro “A Pobreza e a Riqueza das Nações”: “Estamos a viver, sem dúvida, numa época de sobremesa. queremos que as coisas sejam doces; muitos de nós, trabalhamos para viver e vivemos para ser felizes. Nada há de errado nisso; só que isso não promove uma alta produtividade. Queremos alta produtividade? Então devemos viver para trabalhar e obter a felicidade como um subproduto”.

Crónica publicada no site da SÁBADO.

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