Bica & Bagaço - 2
Cavaco Silva fará hoje uma comunicação oficial sobre o casamento homossexual.
Uma declaração ao país, coisa pesada e solene, deve trazer decisão grave. Mas não parece em linha com o que Cavaco sempre defendeu. Quando questionado sobre o assunto na campanha presidencial de 1996 e na de 2006, e até depois de ser Presidente, Cavaco disse sempre que havia assuntos mais importantes para tratar. Assim sendo, logo nesta fase em que há assuntos muuuito mais importantes para tratar, Cavaco sobreleva finalmente o tema e dá-lhe mais atenção do que a pior crise vivida em Portugal nas últimas décadas. Cavaco Silva nada disse ainda sobre os sacrifícios exigidos aos portugueses e, recorde-se, foi eleito numa campanha assente nos argumentos do crescimento económico, para Portugal não ficar atrás dos países de Leste.
Só há dois cenários possíveis, nenhum deles bom para o Presidente e futuro candidato:
a) O PR vai anunciar um veto à lei, aprovada por uma maioria de deputados num Parlamento onde nenhum partido tem maioria, e na qual o Tribunal Constitucional não viu inconstitucionalidades. Vai cavalgar o ambiente proporcionado pela visita do Papa, posicionando-se como um protagonista conservador e colado à Igreja, exercendo uma acção política marcadamente ideológica, o que contrasta com a ideia que sempre quis dar de si, de pragmático, institucional, avesso a dogmas ideológicos. Se bem que um veto justifique mais uma comunicação oficial do que uma promulgação, neste momento haveria motivos bem mais graves do que este a merecer uma declaração oficial do PR.
b) O PR vai anunciar a promulgação do casamento de pessoas do mesmo sexo, desculpando-se com o facto de, muitas vezes, promulgar leis das quais discorda. Justificará a sua decisão por dever institucional. Embora não o diga, sentir-se-á obrigado a fazer uma comunicação ao País por causa do seu eleitorado (em parte conservador e católico) até porque a visita do Papa criou um ambiente de expectativa em relação ao assunto. Dirá, imagino, que este acto de contrição é uma questão de consciência. Se for para anunciar uma promulgação, mais uma vez, Cavaco teria assuntos mais importantes para comunicar ao País. Assim, parecerá que já está a usar a Presidência para fazer campanha eleitoral, pois esta é uma decisão desconfortável para boa parte do seu eleitorado.
Sai uma bica e um bagaço.
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