(Também) No mesmo lado do espelho
«O Alentejo do meu avô era igual ao Alentejo das invasões francesas. Aquilo era a Mauritânia, meus amigos. Coisa áspera. O terceiro mundo estava ali estacionado. Mas, apesar de ser um camponês analfabeto, o meu avô arregaçou as mangas e tirou o país do terceiro mundo. Quando o meu pai nasceu, Portugal já estava no 'segundo mundo'. Por isso, o meu pai já pôde ir à escola: tirou a quarta classe e fez-se à vida. Foi o meu pai, meus amigos, que colocou Portugal a crescer a 9% ao ano. Foi o meu pai, ex-operário e agora empresário, que colocou Portugal no hall de entrada do primeiro mundo. E foi nesse hall que eu nasci. Devido ao trabalho do meu pai, eu estudei além da quarta classe, e, agora, sou o cronista-benjamim do maior jornal do país (para grande desgosto do meu avô, que me queria no "Avante!"). Portugal mudou, e muito, meus amigos. Eu sou a prova disso. E há milhares e milhares de histórias familiares idênticas à minha. Temos juízes, advogados, professores, investigadores, empresários, gestores, escritores, jornalistas e médicos que têm algures um avô analfabeto e um pai com a quarta classe. O país inteiro devia ter orgulho nestas histórias. Porque são estas histórias que fazem a História de um país. São estas epopeias familiares que constroem as narrativas históricas que unem uma nação em momentos de aperto e redenção.
Portugal não está condenado ao declínio. Aliás, a ascensão tem sido a marca da nossa história recente. O meu avô e o meu pai trouxeram Portugal para o primeiro mundo. Com o país às costas, eles subiram a escadaria, desde a empoeirada Mauritânia até à reluzente União Europeia. E, meus amigos, não vai ser no meu turno que Portugal vai aos trambolhões pela escadaria abaixo. Até porque estou mais bem preparado. Só tenho de encontrar o coração que eles tinham.»
Portugal não está condenado ao declínio. Aliás, a ascensão tem sido a marca da nossa história recente. O meu avô e o meu pai trouxeram Portugal para o primeiro mundo. Com o país às costas, eles subiram a escadaria, desde a empoeirada Mauritânia até à reluzente União Europeia. E, meus amigos, não vai ser no meu turno que Portugal vai aos trambolhões pela escadaria abaixo. Até porque estou mais bem preparado. Só tenho de encontrar o coração que eles tinham.»