É pedir muito?
O mais preocupante na histeria institucional em torno da visita de Bento XVI é a constatação de que o Estado se comporta como se houvesse uma religião oficial em Portugal. Se calhar há mesmo e eu é que andei enganado este tempo todo, julgando que isso tinha acabado no tempo do dr. Salazar (que apesar de nunca ter assumido um Estado confessional, andava sempre com o cardeal Cerejeira ao lado, just in case).
A superioridade da democracia liberal e do Estado de Direito é a garantia de direitos e liberdades segundo o primado da Lei - que é cega, universal, igual para todos. Por estes dias fica à evidência que o Estado Português, supostamente laico, não trata as religiões todas por igual. O mesmo Estado que recusou receber oficialmente o Dalai Lama - um líder religioso - vai em peregrinação ao beija-mão a Bento XVI - outro líder religioso.
Como se isso não bastasse, decreta tolerância de ponto, na presunção, errada e abusiva, de que seremos todos católicos ou, no mínimo, de que nos interessamos pela vinda do senhor Ratzinger a Portugal. Nesse pressuposto fecham-se as escolas públicas (mas não as privadas - muitas delas católicas, curiosamente), adiam-se cirurgias e consultas nos hospitais públicos, cortam-se estradas a eito e esbanjam-se dinheiros públicos, de todos, para celebrar o que só interessa a alguns. Eu, pobre ateu, interrogo-me se poderei continuar a utilizar os autocarros da Carris, agora que a Carris se assumiu, com bandeirinhas em todos os autocarros, como uma transportadora católica, coisa que eu não supus que existisse tratando-se de uma empresa pública.
Dir-me-ão: ah, a Igreja Católica ajuda os pobrezinhos, e tal, e as escolas, e o papel social da Igreja, e isto e aquilo. Se é assim, reconheça-se-lhe estatuto de utilidade pública, reconheça-se essa função social com benefícios fiscais e o que bem se entender, como a qualquer outra igreja ou IPSS que desempenhe um papel semelhante e cumpra os mesmos requisitos. Mas sempre dentro da lei, com respeito pela princípio da igualdade perante a lei.
Ir contra isto é permitir que o Estado tome parte em algo de que se devia abster: a relação de cada um com a religião. As religiões não são inócuas, são o que são: facções com uma estrutura de poder e regras, que cada um deve ter a liberdade de aceitar ou recusar. São agremiações como quaisquer outras, a que cada um deve ter a liberdade de aderir ou afastar-se. Cada um deve poder escolher a sua religião ou escolher não ter religião nenhuma. Por mim, irracionalidade por irracionalidade, escolho o Benfica - os jogos são melhores e as bifanas à volta do estádio não são más. Mas para o Estado isto tem que ser absolutamente indiferente, porque faz parte da esfera de liberdade de cada cidadão.
O que o Estado Português tem feito por estes dias é a negação de tudo isto. É empurrar-me para uma celebração de que eu não quero fazer parte e que eu agradecia que não interferisse na minha vida. É pedir muito?
A superioridade da democracia liberal e do Estado de Direito é a garantia de direitos e liberdades segundo o primado da Lei - que é cega, universal, igual para todos. Por estes dias fica à evidência que o Estado Português, supostamente laico, não trata as religiões todas por igual. O mesmo Estado que recusou receber oficialmente o Dalai Lama - um líder religioso - vai em peregrinação ao beija-mão a Bento XVI - outro líder religioso.
Como se isso não bastasse, decreta tolerância de ponto, na presunção, errada e abusiva, de que seremos todos católicos ou, no mínimo, de que nos interessamos pela vinda do senhor Ratzinger a Portugal. Nesse pressuposto fecham-se as escolas públicas (mas não as privadas - muitas delas católicas, curiosamente), adiam-se cirurgias e consultas nos hospitais públicos, cortam-se estradas a eito e esbanjam-se dinheiros públicos, de todos, para celebrar o que só interessa a alguns. Eu, pobre ateu, interrogo-me se poderei continuar a utilizar os autocarros da Carris, agora que a Carris se assumiu, com bandeirinhas em todos os autocarros, como uma transportadora católica, coisa que eu não supus que existisse tratando-se de uma empresa pública.
Dir-me-ão: ah, a Igreja Católica ajuda os pobrezinhos, e tal, e as escolas, e o papel social da Igreja, e isto e aquilo. Se é assim, reconheça-se-lhe estatuto de utilidade pública, reconheça-se essa função social com benefícios fiscais e o que bem se entender, como a qualquer outra igreja ou IPSS que desempenhe um papel semelhante e cumpra os mesmos requisitos. Mas sempre dentro da lei, com respeito pela princípio da igualdade perante a lei.
Ir contra isto é permitir que o Estado tome parte em algo de que se devia abster: a relação de cada um com a religião. As religiões não são inócuas, são o que são: facções com uma estrutura de poder e regras, que cada um deve ter a liberdade de aceitar ou recusar. São agremiações como quaisquer outras, a que cada um deve ter a liberdade de aderir ou afastar-se. Cada um deve poder escolher a sua religião ou escolher não ter religião nenhuma. Por mim, irracionalidade por irracionalidade, escolho o Benfica - os jogos são melhores e as bifanas à volta do estádio não são más. Mas para o Estado isto tem que ser absolutamente indiferente, porque faz parte da esfera de liberdade de cada cidadão.
O que o Estado Português tem feito por estes dias é a negação de tudo isto. É empurrar-me para uma celebração de que eu não quero fazer parte e que eu agradecia que não interferisse na minha vida. É pedir muito?
Etiquetas: Bento XVI, Estado laico, histeria, religião oficial
11/5/10 13:57
Concordo: e o PR podia poupar-nos ao espectáculo de o vermos a apresentar os netinhos, filha e genro, e a fazer foto de família (literalmente). Se queria fazer aquela gracinha, devia tê-la feito em privado.