<body><script type="text/javascript"> function setAttributeOnload(object, attribute, val) { if(window.addEventListener) { window.addEventListener('load', function(){ object[attribute] = val; }, false); } else { window.attachEvent('onload', function(){ object[attribute] = val; }); } } </script> <div id="navbar-iframe-container"></div> <script type="text/javascript" src="https://apis.google.com/js/platform.js"></script> <script type="text/javascript"> gapi.load("gapi.iframes:gapi.iframes.style.bubble", function() { if (gapi.iframes && gapi.iframes.getContext) { gapi.iframes.getContext().openChild({ url: 'https://www.blogger.com/navbar.g?targetBlogID\x3d37878389\x26blogName\x3dElevador+da+Bica\x26publishMode\x3dPUBLISH_MODE_BLOGSPOT\x26navbarType\x3dBLUE\x26layoutType\x3dCLASSIC\x26searchRoot\x3dhttps://elevadordabica.blogspot.com/search\x26blogLocale\x3dpt_PT\x26v\x3d2\x26homepageUrl\x3dhttp://elevadordabica.blogspot.com/\x26vt\x3d248628773197250724', where: document.getElementById("navbar-iframe-container"), id: "navbar-iframe" }); } }); </script>
elevador da bica

Caderno de memórias coloniais virtuais


Nos 800 quilómetros entre Maputo e Vilanculos, só depois do Xai-Xai (a um quarto da viagem - milímetros no mapa de Moçambique) é que o queixo começa a cair. A estrada estende-se até perder de vista, quebrada por lombas. A terra ao lado é vermelha, os buracos lunares e os condutores dos chapas obrigam a estar de olho aberto. O sol fustiga o mato e as pessoas que andam pela berma da estrada - e há sempre pessoas na berma da estrada. Tudo forte, tudo vasto, como deve ser - como nós esperávamos que iria ser. A partir de Inharrime a boca abre-se mais e assim fica enquanto atravessamos a província de Inhambane. A província onde a minha mãe nasceu.

Pelo caminho passamos em Morrumbene, uma vila que o guia Lonely Planet chama de "sítio onde só vale a pena parar se ficarmos ali presos à noite". Se esse infortúnio se abater sobre o viajante, o guia sugere o único sítio com camas na vila: a Pousada do Litoral. A pousada que foi dos meus avós durante mais de 30 anos, cenário referencial das dezenas de histórias que ouvi em miúdo, enquanto eles (aqueles avós) tomavam conta de mim.

Olhando agora para trás acho que percebo porque saí do carro e puxei logo da máquina fotográfica. A Susan Sontag escreveu que a máquina é um objecto de defesa e distanciamento entre a realidade e quem a olha, e ali eu estava em zona de desconforto. É estranho visitar a cenografia virtual que construímos na infância, a partir das memórias não resolvidas das pessoas que nos são mais próximas. Os lugares que aprendemos a mitificar e que quase nunca são como imaginámos.

As fotografias foram um erro (atraíram atenção e recados indesejados) e seguimos viagem. No regresso não houve merdas - parámos o carro na estação de serviço (antiga "Estação Faria") e entrámos na pousada pelo bar. Às caras fechadas ao balcão pedimos uma 2M, que veio bem gelada. Entrámos na sala de jantar, passámos na recepção, metemos pelo corredor que dá para o pátio. Sempre imaginei que veria o lugar com a amargura da perda deles. Mas aconteceu o contrário. Afastei a decadência do lugar e imaginei-os ali noutra era - e assim reescrevi as memórias coloniais que não vivi. Deixei de vê-los como ex-colonos amargurados e a caminho da velhice, iguais aos que a Isabela Figueiredo tão bem descreve (Almeida Santos e Mário Soares eram figuras odiadas em minha casa). Vi-os ali, incansáveis e inconscientemente felizes, longe do cinzentismo e da miséria da Metrópole.

“Caderno de memórias coloniais virtuais”