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elevador da bica

O meu direito à blasfémia

Para quem disse no Parlamento Europeu que o caso TVI representava uma asfixia na liberdade de imprensa, exortar o escritor José Saramago a renunciar à nacionalidade parece-me coisa de Taliban e de maometano ofendido com as caricaturas do profeta.

Há erros que não se percebem: Mário David, eurodeputado do PPE, pelo PSD, tem aqui o seu momento Torquemada. A liberdade de expressão não pode chegar à religião? Em democracia não temos o direito à blasfémia?

Saramago não disse mais do que muita gente diz e pensa: o Antigo Testamento é um livro cruel, da paciência de Job, à morte de Caim e do olho-por-olho e dente-por-dente à provação de Abraão, a quem Deus mandou matar o filho só para ver se ele O amava. Eu não concordo com Saramago em muitas outras coisas, mas concordo com ele nesta visão sobre este livro antigo que encerra uma beleza fundamental e muitos segredos da natureza humana, mas que nos mostra um Deus que não aprecio.

Mas mesmo que não concordasse com Saramago, admitia-lhe o direito de o dizer - e o ponto é este. Eu podia discordar. Argumentar. Mas não o queimava na fogueira como os mais papistas que o Papa querem fazer. Desde Sousa Lara que não aprendem com os erros.

Para Mário David, os escritores não devem pensar, ou se pensam não o devem dizer? Os filósofos não devem pensar, e se o pensam não o devem dizer? Filósofos, escritores, intelectuais, pescadores, carpinteiros e trolhas não devem dizer o que pensam se pensarem que Deus não existe, ou que há uma ideia de um Deus cruel e vingativo do qual não gostam?

Às vezes descubro esta Idade Média que ainda vive no meio de nós.

Etiquetas:

“O meu direito à blasfémia”

  1. Blogger Grifo disse:

    O problema é quando se fala do que não se conhece... A bíblia é sujeita a grandes interpretações, pelo menos para os católicos... O antigo testamento serve de referencia e complemento ao novo, é um antecedente... Os ensinamentos católicos provém do novo testamento e os do antigo, são interpretados tendo em conta também a época dos escritos... Naquela época fazia mais do que sentido a mulher oprimida, a pena de morte, a tortura e os sacrifícios e um deus cruel...

    São Lucas 16:16
    "A Lei dos Profetas subsistiram até João a partir de então, é anunciada a Boa-Nova do Reino de Deus, e cada qual esforça-se por entrar nele."

    São Mateus 5 :17
    17:"Não penseis que vim revogar a Lei dos Profetas. Não vim revogá-los, mas levá-los à perfeição."

  2. Blogger Vìtor Matos disse:

    Eu sei isso que o meu caro Grifo escreve.
    A questão é que nem todos os judeus, nem todos os católicos e seguramente nem todos os cristãos olham para o Antigo Testamento da mesma maneira.
    O que significa que um ateu, agnóstico ou não crente tem o mesmo direito de todos os outros de manifestar a sua opinião sobre um livro que nesse caso nem considera sagrado. Aliás, acho que os livros do AT são peças literárias fabulosas tendo em conta a sua própria antiguidade. Já do ponto de vista filosófico tudo se pode discutir.
    A polémica tem a ver com a liberdade de expressão e eu admito todas as opiniões sem ter de ser convidado a abandonar o meu País por um deputado eleito, não é um tipo qualquer. E até é um deputado que eu conheço e por quem tenho consideração, mas também não deixa de ser mais um pobre pecador.

  3. Blogger João Cândido da Silva disse:

    A liberdade de expressão inclui a liberdade de sugerir a alguém que abandone o país e assuma outra nacionalidade. Não é politicamente correcto? Não, não é. Mas é o exercício de um direito, cuja substância pode, ou não, merecer a nossa concordância. Tal como as declarações de Saramago.