As declarações dos políticos
Confesso que não percebo os deputados que pediram ao Tribunal Constitucional para não apresentarem as declarações de rendimentos. A lei relativa ao controlo público da riqueza dos titulares dos cargos políticos está mal feita e não é mais do que um texto para inglês ver. Num momento em que tanto se fala de corrupção, podemos fazer uma reflexão.
Os membros do Governo, por exemplo, são obrigados a declarar património imobiliário, carros, barcos, aviões, acções, fundos, PPR, contas a prazo e outros produtos financeiros. Fora disto, ficam as contas à ordem.
O sistema, porém, não faz sentido. Nem serve para o controlo dos rendimentos e património que tinham antes e depois de irem para os cargos públicos.
Por algumas razões:
a) Estranhamente, as declarações que estão em consulta pública no TC não obrigam o titular a comprová-las com a entrega para consulta do IRS do ano em causa;
b) As declarações têm a ver com as posses do político naquele momento, sem ter em conta o passado – por exemplo até dois anos antes. Isto permite que, se quiserem esconder património, passem dinheiro, títulos, contas, carros, para o nome de familiares, amigos, etc.
c) É uma declaração de boa-fé, que não está suportada em qualquer documento.
d) Cada político faz uma interpretação diferente da lei. Por exemplo: a lei obriga que se declarem as datas e montantes das acções ou fundos que detêm; mas uns entendem que se trata da data de aquisição e do valor investido nesse momento (como Mário Lino); outros pensam que se trata do valor das acções e dos fundos no momento de entrega da declaração (como Severiano Teixeira).
Tomemos o caso de José Sócrates por exemplo:
a) Desde 1998 – ano em que as declarações passaram a poder consultar-se - que Sócrates não declara qualquer conta a prazo, PPR, fundo ou acções. Actualmente, diz apenas que tem 2500 euros em acções do Benfica, embora a lei defina que tem de explicitar o número de acções e o valor nominal (o que não cumpre); é um pormenor.
b) Embora duvide que Sócrates corresse o risco de apresentar uma declaração destas ocultando elementos, não deixa de ser estranho que um homem entre os 40 e os 50 anos nunca tenha declarado uma conta a prazo, um pacotinho de acções, um PPR para acautelar o futuro, um PPE para os filhos, enfim, o que um remediado cidadão normal faria.
c) Resumindo, desde 1998, Sócrates só tem contas à ordem. O dinheiro que ele tem perdido com a inflação...
d) O seu único produto financeiro é um empréstimo de 15 mil contos à CGD, para pagar parte do seu apartamento no luxuoso edifício da Rua Castilho. Ao contrário de outros ministros que declaram todos os anos a dívida à banca actualizada, Sócrates repete há 10 anos que pediu 15 mil contos à caixa e não se sabe quanto deve. É uma interpretação.
Conclusões:
Partindo do princípio que Sócrates não falta à verdade, devemos colocar a questão: os políticos não gostam de mostrar o que têm. No caso do primeiro-ministro, prefere até prejudicar as suas poupanças para ninguém saber o que tem nem quanto tem – para além do rendimento anual.
O que parece é. Os políticos que pedem para ocultar os seus rendimentos e património, e os que arranjam maneira de mostrar declarações minimalistas, mesmo sem infringir a lei, são inimigos da transparência. E os inimigos da transparência até podem ser sérios e querer apenas manter a privacidade, mas escudam atrás de si os que não são.
Os membros do Governo, por exemplo, são obrigados a declarar património imobiliário, carros, barcos, aviões, acções, fundos, PPR, contas a prazo e outros produtos financeiros. Fora disto, ficam as contas à ordem.
O sistema, porém, não faz sentido. Nem serve para o controlo dos rendimentos e património que tinham antes e depois de irem para os cargos públicos.
Por algumas razões:
a) Estranhamente, as declarações que estão em consulta pública no TC não obrigam o titular a comprová-las com a entrega para consulta do IRS do ano em causa;
b) As declarações têm a ver com as posses do político naquele momento, sem ter em conta o passado – por exemplo até dois anos antes. Isto permite que, se quiserem esconder património, passem dinheiro, títulos, contas, carros, para o nome de familiares, amigos, etc.
c) É uma declaração de boa-fé, que não está suportada em qualquer documento.
d) Cada político faz uma interpretação diferente da lei. Por exemplo: a lei obriga que se declarem as datas e montantes das acções ou fundos que detêm; mas uns entendem que se trata da data de aquisição e do valor investido nesse momento (como Mário Lino); outros pensam que se trata do valor das acções e dos fundos no momento de entrega da declaração (como Severiano Teixeira).
Tomemos o caso de José Sócrates por exemplo:
a) Desde 1998 – ano em que as declarações passaram a poder consultar-se - que Sócrates não declara qualquer conta a prazo, PPR, fundo ou acções. Actualmente, diz apenas que tem 2500 euros em acções do Benfica, embora a lei defina que tem de explicitar o número de acções e o valor nominal (o que não cumpre); é um pormenor.
b) Embora duvide que Sócrates corresse o risco de apresentar uma declaração destas ocultando elementos, não deixa de ser estranho que um homem entre os 40 e os 50 anos nunca tenha declarado uma conta a prazo, um pacotinho de acções, um PPR para acautelar o futuro, um PPE para os filhos, enfim, o que um remediado cidadão normal faria.
c) Resumindo, desde 1998, Sócrates só tem contas à ordem. O dinheiro que ele tem perdido com a inflação...
d) O seu único produto financeiro é um empréstimo de 15 mil contos à CGD, para pagar parte do seu apartamento no luxuoso edifício da Rua Castilho. Ao contrário de outros ministros que declaram todos os anos a dívida à banca actualizada, Sócrates repete há 10 anos que pediu 15 mil contos à caixa e não se sabe quanto deve. É uma interpretação.
Conclusões:
Partindo do princípio que Sócrates não falta à verdade, devemos colocar a questão: os políticos não gostam de mostrar o que têm. No caso do primeiro-ministro, prefere até prejudicar as suas poupanças para ninguém saber o que tem nem quanto tem – para além do rendimento anual.
O que parece é. Os políticos que pedem para ocultar os seus rendimentos e património, e os que arranjam maneira de mostrar declarações minimalistas, mesmo sem infringir a lei, são inimigos da transparência. E os inimigos da transparência até podem ser sérios e querer apenas manter a privacidade, mas escudam atrás de si os que não são.