O meu amigo K.
O meu amigo K. tem 49 anos e não é agrimesor. Foi jornalista. Agora, desiludido, é tradutor e faz umas peças de free-lance. Viajei com ele pelos Estados Unidos num grupo de jornalistas europeus há dois anos. E não lhe fiquei a conhecer a história, que só agora ouvi, depois de umas cervejas no centro de Praga. Deve haver milhares de checos assim. Os pais eram do Partido Comunista, sem grandes ilusões - aliás, a mãe quis sair, mas logo depois de 1948 foi aconselhada a não abandonar a militância -, até que chegou a Primavera de Praga, em 1968, e a ilusão parecia tornar-se realidade. Mas o socialismo de rosto humano era só mais uma utopia: com a marcha dos tanques soviéticos na Praça Venceslau o pai de K. passou de engenheiro a operário braçal e o próprio K. quando chegou o momento da faculdade foi impedido, por razões políticas, de frequentar Filosofia ou qualquer outro curso de humanísticas. Tirou Geologia. E já teve sorte.
Até meados dos anos 80, trabalhou em minas. Depois, fartou-se. Foi até à Jugoslávia, conheceu um alpinista austríaco, pediu-lhe boleia e atravessou a fronteira para a Áustria. Teve sorte. Pela primeira vez, o austríaco não foi controlado na fronteira. Caso contrário, a sua vida teria sido diferente. Passou por um campo de refugiados na Áustria. Exilou-se no Canadá. E fixou-se, mais tarde, na Alemanha, a trabalhar para uma rádio em língua checa. Começou aí uma tardia carreira jornalística. Regressou à pátria já bem depois da Revolução de Veludo.
Hoje, vive desiludido. Quer saber quanto tempo demorou a democracia a estabilizar em Portugal. Diz que na República Checa a tensão entre esquerda e direita é uma panela de pressão prestes a explodir. Detesta o presidente Vaclav Klaus (que já era odiado por Vaclav Havel), mas também não gosta de nenhum político em especial. Raramente vai ao centro da cidade. E pergunta-nos, com sinceridade: "Estão e férias?! Então, o que é que vieram fazer para Praga?"
Até meados dos anos 80, trabalhou em minas. Depois, fartou-se. Foi até à Jugoslávia, conheceu um alpinista austríaco, pediu-lhe boleia e atravessou a fronteira para a Áustria. Teve sorte. Pela primeira vez, o austríaco não foi controlado na fronteira. Caso contrário, a sua vida teria sido diferente. Passou por um campo de refugiados na Áustria. Exilou-se no Canadá. E fixou-se, mais tarde, na Alemanha, a trabalhar para uma rádio em língua checa. Começou aí uma tardia carreira jornalística. Regressou à pátria já bem depois da Revolução de Veludo.
Hoje, vive desiludido. Quer saber quanto tempo demorou a democracia a estabilizar em Portugal. Diz que na República Checa a tensão entre esquerda e direita é uma panela de pressão prestes a explodir. Detesta o presidente Vaclav Klaus (que já era odiado por Vaclav Havel), mas também não gosta de nenhum político em especial. Raramente vai ao centro da cidade. E pergunta-nos, com sinceridade: "Estão e férias?! Então, o que é que vieram fazer para Praga?"